sábado, 21 de agosto de 2010

A Lenda do Cabeça de Cuia

A lenda do Cabeça-de-Cuia é uma das mais populares do Piauí. O mito se iniciou quando um jovem pescador chamado Crispim foi pescar no Rio Poti em busca de sua refeição diária, mas para sua infelicidade, não conseguiu apanhar sequer uma mera piabinha. Ao final da tarde, Crispim retornou para casa. 
Cansado, com fome e sem nada nas mãos, o jovem perguntou para a mãe sobre a refeição do dia, mas a coitada tinha preparado apenas um caldo “fraco” feito com um resto de osso de boi. Revoltado com toda aquela cena de miséria, Crispim descontou toda a sua ira na impotente mãe, a única que compartilhava com ele aquele momento de escassez. O jovem descontrolado espancou ferozmente a mãe, ferindo-a gravemente, tanto no corpo como na alma. 
Já em estado terminal, a mãe agonizante de crispim sussurrou uma praga ao vento, pedindo justiça ao poder divino. A partir daquele momento Crispim tornou-se o filho amaldiçoado, que foi punido por seu descontrole. Como resultado da praga da mãe, o jovem sofreu uma horrenda metamorfose. Sua cabeça cresceu, seus dedos criaram nadadeiras semelhantes às de pato. Sua boca se alargou e seus dentes ficaram comparáveis aos de um jacaré. Para completar, Crispim ficou condenado a habitar as águas dos rios Parnaíba e Poti, alternando sua morada a cada seis meses. 
A aberração em que Crispim se transformou é conhecida até hoje como Cabeça de Cuia. Antes que a maldição seja quebrada e Crispim seja libertado, ele terá que engolir sete moças virgens de nome Maria. Os mais antigos contam que esse monstro vaga até hoje, seis meses assombrando águas do Rio Parnaíba e seis meses aterrorizando as margens do Rio Poti. A seguir, compartilho o poema que criei para contar esse mito local.

Cabeça-de-cuia
por Rafael Nolêto
Crispim foi pescar quando a fome apertou
Passou toda a noite na beira do rio.
Mas foi tudo em vão, pois nada pegou
E continuou com o bucho vazio.

Decepcionado e sem peixe na mão
Voltou para casa sem a refeição.
A velha mãezinha, com muito esforço
Preparou-lhe um caldo com resto de osso.

A fome era grande e o estômago roncava
Estava em fase de auto devoração.
A perna tremia, a cabeça rodava
Crispim recebeu o encosto do Cão.

Possuído pela fome, fez do osso sua arma,
Espancou a própria mãe e definiu o seu carma.
A mãe injuriada praguejou o filho ingrato,
Que reclamou da comida e cuspiu no próprio prato.

Estava formada a bagaceira!
A cabeça do jovem começou a inchar,
Nos dedos surgiram pelancas,
As pernas ficaram mancas.

Naquele momento a terra tremeu,
Crispim atirou-se na beira do rio.
A mãe deu ataque, ligeiro morreu
Foi o efeito da praga que logo surtiu.

Um monstro sinistro ali surgia
Criatura horrenda, cheia de magia.
Para desfazer toda essa maldição
Cabeça-de-Cuia tem uma missão.

Sete virgens de nome Maria,
Cabeça-de-Cuia deve devorar.
Deve caçá-las de noite e de dia,
Senão sua saga não vai terminar.

Seis meses no Rio Parnaíba,
Seis meses no Rio Poti.
Seus lamentos só terminam
Quando o seu fardo cumprir.
Ilustração: Rafael Nolêto

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